As impressionantes imagens causadas pelos atípicos impactos das chuvas que causaram fortes estragos na SP-098 (Mogi Bertioga), a exemplo de outras diversas rodovias pelo Sul e Sudeste do País no início deste ano, ao mesmo tempo em que alertam para eventos climáticos aparentemente mais severos, também deram uma boa dimensão da agilidade em enfrentar problemas por parte do Departamento de Estadas de Rodagem de São Paulo (DER-SP).
Parcialmente liberada em apenas 15 dias e com obras em andamento pelos próximos meses – que procurarão oferecer mais resiliência à superestrutura da pista – o feito, digno de registro, é prova de que é possível vencer desafios inesperados, de forma rápida e eficiente, por meio da engenharia.
“Por ‘complexo de vira-lata’ entendo eu a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo. O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima”. Conceituada pelo lendário escritor, jornalista, dramaturgo e cronista esportivo Nelson Rodrigues, a expressão que motiva debates acalorados em diversas áreas da atuação do Brasil, de tempos em tempos, esbarra trocando tintas – de forma totalmente infundada – com um dos maiores e mais consagrados produtos de exportação brasileiros: a engenharia. Normalmente pintada como ineficiente pelo estado de conservação de ruas, estradas e pela em muitos casos pressuposta demora em obras “faraônicas”, “superfaturadas” e costumeiramente por leigos no assunto (vale lembrar, utilizando como pano de fundo o futebol, em que muitos torcedores às vezes são “melhores técnicos” do que os profissionais contratados por salários milionários e que estudaram o esporte por anos à fio), esta arte e ciência tão bem desenvolvida nas terras de Vera Cruz, sofre com uma fama injusta. E o que é pior: quando performa bem, é pouco ou nada noticiada, como no caso – possivelmente recorde – de liberação da pista na SP-098.
Um outro prisma
Da completa interdição à liberação parcial, uma outra chuva, essa de comparativos com fatos acontecidos na história recente, alagaram redes sociais e temperaram comentários de “especialistas” na grande mídia. A comparação? Com o Japão, a destruição causada por sismos, e a proverbial eficiência japonesa, que, em algumas alusões, reconstruiu em apenas 6 dias uma “rodovia” danificada na província de Ibaraki, que liga Naka à Tokio. Pois bem. Um feito notável, surpreendentemente para muitos (certamente não para Rodovias&Vias), porém nem um pouco distante do que o Departamento Estadual de Estradas de Rodagem de São Paulo e as empresas paulistanas puderam realizar. Certamente, correndo o risco de comparar “alhos com bugalhos”, vale à pena colocar alguns pontos em perspectiva. O reparo feito em Naka, em apenas 6 dias, compreendia um segmento de 150 metros, na rodovia Great Kanto, em terreno razoavelmente nivelado e em área aberta. No caso da Mogi-Bertioga, as operações se deram de forma muito mais extensa (e tensa). Além do colapso que em termos práticos, obliterou a pista nos dois sentidos, no Km 82, (de forma até visualmente semelhante aos danos na pista de Naka), houve ainda queda de barreira nos Km 90 e 91, e uma erosão no Km 87. Tudo isso, em uma área de Serra, portanto em um terreno difícil, ainda sob risco, e em meio à áreas de proteção ambiental. Nada menos do que 4 frentes diferentes em situações distintas em apenas – nunca é demais repetir – 15 dias, ao custo de R$ 9,4 milhões. O Esforço do DER-SP, cumprindo uma determinação (praticamente imediata) do governador Tarcísio de Freitas (cujo perfil não é, digamos, desses que contempla a grama crescer sob seus pés), pôde, antes das 8h da manhã do dia 7, postar em seu twitter: “O tráfego da rodovia Mogi-Bertioga (SP-098) está liberado, depois de 15 dias de interdição para a recuperação da pista atingida por deslizamento. As obras prosseguem para melhoria na infra no entorno da rodovia. Entregue antes do prazo graças ao empenho do @_dersp e da @semilsp” (esta última, referência à Secretaria de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística do Estado de São Paulo, liderada pela “supersecretária” Natália Resende, que afirmou: “A liberação antecipada desse trecho da rodovia foi possível graças ao empenho das equipes do DER, que trabalharam intensamente nas obras de recuperação do pavimento danificado. Além disso, os trabalhos continuam para concluir, por exemplo, a construção do muro de contenção e a limpeza de detritos, sempre visando a segurança viária dos usuários”.
Na linha de frente
Ainda que o DER-SP tenha merecido destaque na bem-sucedida operação, é preciso também destacar a robustez do ataque às frentes de obra, por parte da Construtora Kamilos Limitada (CKL). Fora a natureza da contratação, em caráter urgente – portanto muito mais célere – a companhia não mediu esforços diante da situação, com turnos de trabalho que variaram de 7h às 0h na primeira semana e das 7h às 22h na segunda semana, com reforço tanto de pessoal, quanto de maquinário e caminhões. Ainda, de acordo com informações da empresa, foi utilizado material pétreo, além de soluções de engenharia que visaram máxima rapidez sem perda de qualidade no trabalho. Ainda, mostrando completa compreensão da conjuntura, a empresa ofereceu um desconto de 10% no trabalho. Enfim. Voltando à comparação feita logo acima, a imprensa mundial, chamou os engenheiros japoneses de “heróis da estrada”. Título conferido em reportagens desde o Daily Mail até o “Times”. Pois bem. Também aqui tivemos heróis para os quais “Não houve uma coisa fantástica, houve um comprometimento da equipe de obra, um apoio muito grande e forte por parte do DER, da Polícia Rodoviária e da Polícia Civil de ajudar no bloqueio da rodovia. Todas as mãos se uniram”, segundo declarou à Gazeta do Povo na época, o engenheiro Paulo Pitta, coordenador de obras da Construtora Kamilos. De toda sorte, a lição que se não fica, deveria ficar é: “Yes, nós temos engenharia”. E das melhores.
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